sábado, 29 de agosto de 2009

EIDOS INFO-ZINE # 18 ( PARTE 2)


Os anarquistas tem dois sexos: a feminização da cultura política libertária

Em São Paulo nos primórdios do século XX, o alto número de imigrantes europeus, a nascente industrialização, as altas jornadas de trabalho, o emprego da mão de obra infantil e a super exploração do trabalho feminino instituíram e estruturaram uma conjuntura no interior da qual o anarquismo se firmou e foi difundido.
Aderindo ao anarquismo sindicalista ou ao anarco-comunismo, as duas correntes mais expressivas do movimento anarquista de São Paulo, os operários e operárias lançaram mão dos diferentes métodos e estratégias de ação direta para resistir e protestar contra os abusos do patronato e Estado brasileiros.
Juntos, homens e mulheres militaram no movimento anarquista, divulgaram as suas idéias na imprensa operária, falaram em público nos comícios, praticaram atos de sabotagem, realizaram boicotes e participaram de greves, enfim compartilharam dessa cultura política libertária.
Mas, uma pergunta persiste, essas mulheres ao ingressarem no movimento operário e adotarem o anarquismo como arma ideológica na sua luta política, apenas repetiam e copiavam os homens? Ou elas iam além, e criavam e inovavam?
Nesse artigo, apresentaremos uma análise sobre a participação das mulheres no movimento anarquista brasileiro, em São Paulo, nas duas primeiras décadas do século XX. Para tanto, tomaremos emprestados alguns conceitos do filósofo alemão Georg Simmel. Balizados pelos conceitos de cultura feminina e feminização da cultura, iremos analisar a ação das mulheres anarquistas, procurando perceber em que medida a sua militância alterou a face até então assumida por esse movimento.
Georg Simmel, no ensaio “A Cultura Feminina”, publicado no livro “A filosofia do Amor”, desenvolve reflexões bastante interessantes e instigantes a respeito do impacto causado pelo ingresso massivo das mulheres na economia, arte, direito e medicina.Embora não trabalhe especificamente com objeto que  elencamos nesse trabalho, parece que Simmel fornece elementos teórico-conceituais importantes para poder refletir sobre o processo feminização da cultura política libertária.
Diante dos movimentos femininos e feministas, que apareciam, ou melhor, irrompiam, por toda Europa questionando o machismo e colocando a emancipação das mulheres em questão Simmel se perguntava quais seriam os impactos disso na cultura ocidental. Já que:

Será que vão nascer de semelhante movimento produções inteiramente novas, qualitativamente distintas das precedentes e que não se limitem a multiplicar as antigas? O reino dos conteúdos de cultura será objetivamente ampliado com isso? Não se vai se contentar com copiar, vai se inventar? (SIMMEL, 1993, p.70)


Para Simmel a cultura não é uma faculdade exterior em relação ao homem e a mulher,e, que portanto a cultura tem sexo. Partindo de tal premissa, o pensador alemão, com toda perspicácia que lhe é inerente, percebeu que a cultura ocidental, com raríssimas exceções, tem assumido um conteúdo eminentemente masculino. A indústria, o comércio, a ciência, a administração civil e a religião foram criadas pelos homens, e a sua manutenção exige ou demanda forças especificamente masculinas.
Certas características, diz Simmel, que singularizam e identificam o espírito masculino na sua dimensão psicológica, tais como a dissociação entre objetividade e subjetividade estão na base da cultura ocidental. De acordo com ele:

(...) toda divisão do trabalho bastante avançada significa que o sujeito se separa o de seu trabalho, o qual se integra então em contexto objetivo, em que se dobra ás exigências de uma totalidade impessoal, enquanto os interesses subjetivos e os movimentos interiores do ser humano constituem, por sua vez, um mundo próprio...Se essa possibilidade psicológica não subsistisse, nossa cultura, construída sobre a mais extrema divisão do trabalho seria... impossível (...). ( SIMMEL, 1993, p.73)


Já a identidade das mulheres, construída a partir do âmbito doméstico e do lar “baseia-se nessa unidade, nessa solidariedade imediata, orgância, entre a pessoa e cada uma de suas manifestações, em suma na indivisibilidade do eu” (SIMMEL, 1993, p73)
Passando por um período de rápidas e profundas transformações em diferentes áreas que integram o campo da ação e saber humanos, Simmel, temia que as mulheres perdessem essa experiência secular.
Na visão de Simmel a resolução desse problema se encontraria na construção de uma nova modelação das atividades exercidas pelos homens e mulheres.
Tratava-se, em primeiro lugar, de estabelecer uma outra divisão dos trabalhos, de redistribuir os trabalhos globais de uma profissão dada, de reunir depois os elementos especificamente adaptados ao modo de trabalho especificamente femininos, para constituir esses ofícios parciais, singulares, diferenciados.
Procurando avaliar as implicações disso na medicina, por exemplo, Simmel afirma que:

A questão que colocamos é de saber se as médicas, além de um aumento do bem-estar físico e moral, proporcionarão alguma melhoria na cultura médica impossível de se realizar por meios masculinos. Ora pode-se efetivamente esperar tal coisa, dado que o diagnostico e a terapia, dependem, ambos, numa parte não desprezível, da capacidade de sentir o estado do paciente. Os métodos de exame clínico tidos como objetivos logo se esgotam, se não forem completados por um sentimento subjetivo do estado do doente e de seus sentimentos, seja esse conhecimento imediatamente instintivo, seja mediatizado por manifestações quaisquer... É por isso que estou persuadido de que, confrontada a mulheres, uma médica, além de ter diagnosticado mais exato e o pressentimento mais fino para tratar dos casos individuais de maneira conveniente, ainda poderia, sob o ângulo puramente cientifico descobrir conexões típicas, não detectáveis por um médico, e dar com isso contribuições específicas à cultura objetiva. (SIMMEL, 1993, p.76).


Por meio dessa assertiva pode-se perceber que Simmel não queria que as mulheres fossem tolhidas ou excluídas dos direitos que os homens possuem. Muito pelo contrário, a contribuição especifica das mulheres a cultura objetiva, só seria possível se elas antes desfrutassem da formação e oportunidade que os homens dispunham, não para imitá-los, mas, para “adquirir a base, o material e a técnica necessários a suas possibilidades particulares de trabalho” (SIMMEL, 1993, 86)
Portanto, o ingresso e participação das mulheres na cultura já historicamente dada seria bastante enriquecedor, pois a criação de uma nova nuança desse tipo, ou mesmo de um novo, continente da cultura, não corresponderia somente a formula social do desenvolvimento.
Colocadas essas questões é possível avançar na discussão e analisar mais de perto a historiografia brasileira do movimento anarquista e do movimento operário.A maioria dos trabalhos publicados até pouco tempo, deixam clara a sua preocupação com a dimensão social e política da luta travada pelos anarquistas, sem atentar muito para a questão de gênero . Apenas em tempos mais recentes, com o crescimento de estudos na área de história das mulheres e com o surgimento do conceito de gênero é que começou a se perceber a dimensão sexuada das práticas sociais e políticas dos agentes históricos.
Na esteira das pesquisas que procuram privilegiar a trajetória das mulheres no processo histórico, surgem na década de 1980 alguns trabalhos sobre o anarquismo a partir da perspectiva de gênero, revelando assim uma faceta feminina do movimento libertário brasileiro. Os trabalhos de CORRÊA (1982) e RAGO (1985) entre outros são uma amostra expressiva de tal tendência na historiografia sobre o movimento anarquista.
A leitura desses dois trabalhos foi de fundamental importância, pois possibilitou a nossa inserção no interior de uma historiografia pioneira acerca da atuação das mulheres no movimento anarquista. Porém, os referidos trabalhos, analisam a participação das mulheres no movimento anarquista sem discutir, de uma forma mais aprofundada, os impactos disso no processo de construção da cultura política libertária.
Para entender melhor essa questão realizamos uma pesquisa junto ao jornal anarquista “Terra Livre”, onde encontramos alguns artigos que nos ofereceram a matéria- prima para a realização desse trabalho.
Em um artigo intitulado “A Equivalência dos Sexos”, o anarquista Carlos Alberto chamou a nossa atenção para o fato de que a diferença da mulher em relação ao homem não devia ser tomada como sinônimo de inferioridade. Em sua avaliação, o simples fato de que os homens sejam dotados de uma capacidade lógica ou de abstração maior, não quer dizer que fossem superiores se comparados com as mulheres. A respeito desse assunto dizia que:

Admitamos pois que a mulher pensa diferentemente do homem, que pensa menos, se querem, e não receemos com isso diminuí-la. Se pensa menos, sente, actua melhor ao que parece. Há nella mais concordância e armonia entre a idéia e o acto, mais decisão, mais força para aceitar a vida e mais coragem para viver. (Alberto, Carlos. A Equivalência dos Sexos. Terra Livre, 22 mar. 1910, p.3)

Como se pode perceber o autor do texto procura discutir e avaliar as especificidades da cultura criada e desenvolvida pelas mulheres. Em sua opinião, as mulheres sentem mais e pensam menos, isso as tornaria mais aptas do que os homens para a ação.
Finaliza o seu artigo, argumentando que existe apenas uma única solução para o impasse criado pela desigualdade entre os gêneros, pois:

Porque não responder, dum modo mais categórico, às vilanias dos misóginos, com análise do tipo feminino, tipo que não vale mais nem menos do que o seu par, o seu tipo masculino, e o que o completa? Porque não perguntar aos homens, por mais talentosos e geniaes que sejam, como executariam as suas obras sem a mulher, e para quem, sem ella, a quereriam continuar? (...)Dos sexos opostos um ao outro só pode sair num certificado de equivalência. (Alberto, Carlos. A Equivalência dos Sexos. Terra Livre, 22 mar. 1910, p.3)



Com as mesmas preocupações, a militante libertária Josefina Stefani Bertacchi, no artigo intitulado “Na Brecha” procura desmistificar a idéia segundo a qual a diferença da mulher em relação ao homem significasse a inferioridade desta em relação aquele.

Deixemos as longas e inúteis discussões de se a mulher é igual ou mais ou menos inteligente do que o homem. A mulher não é homem porque é mulher e o homem não é mulher porque é homem.
Um e outro, tendo órgãos diferentes e por isso funções diferentes por graus e por qualidades, entre si e se completando e se aperfeiçoando (Bertacchi, Josefina Stefani, Na Brecha. Terra Livre, 15 Jun,1910, p.2)


Embora Bertacchi procure na biologia uma explicação para entender as diferenças existentes entre homens e mulheres, ela não aceita a idéia de que a desigualdade entre os gêneros tenha outra origem, a não ser a social. Nesse sentido, avança na discussão ao colocar que :
Se no correr dos séculos nenhuma mulher, tem feito inovações e descobertas científicas (só exceptuando Mfme Curie que descobriu o radism)... se a mulher nunca escreveu uma obra de valor absoluto, quer dizer que ella não tem altas qualidades sintéticas... é por causa dessa educação comoleta e hereditária. (Bertacchi, Josefina Stefani, Na Brecha. Terra Livre, 15 Jun,1910, p.2)


Por outro lado, a anarquista lembra que em virtude dessa exlcusão, as mulheres acabaram criando ou construindo novas formas de inserção social, política e cultural, que se diferem qualitativamente daquelas criadas pelos homens.

Como professora, médica de mulheres e de crianças, como escritora de romances pessoais e sociais, e particularmente como pregadora de boas idéias, deu prova a todos que tem aptidões apreciadíssimas, que fazem dela o que deve ser, isto é incansável companheira incansável no trabalho, útil a tornar populares as idéias mais abstratas, e são humildes quanto ardorosas, redentora das classes desoladas. (Bertacchi, Josefina Stefani, Na Brecha. Terra Livre, 15 Jun,1910, p.2)



No que concerne às mulheres anarquistas podemos argumentar que: em virtude da divisão sexual do trabalho, as mulheres se viram privadas de ser guerreiros, soldados e presidentes. Inexperientes em cargos habitualmente ocupados por homens, as mulheres desenvolveram uma experiência maior na gestão da vida, na administração do lar, no trato com crianças e com os idosos, de vínculos com o corpo e com a sexualidade. A partir dessas experiências, construíram uma visão menos dura, objetiva e racional do mundo, incorporando também a flexibilidade, a subjetividade e os sentimentos. Assim, o ingresso e participação das mulheres no movimento anarquista constituiu um processo que se inscreveu dentro de um registro político diferenciado. Ao se tornarem militantes ácratas, as mulheres não perderam essa experiência, mas, sim a conservaram, trazendo, portanto, contribuições específicas para a cultura política libertária.
Se hoje, as mulheres tem o direito a uma vida profissional, a estudar, a participar da vida política, se hoje, as mulheres, podem então, dar uma contribuição específica a cultura objetiva, até pouco tempo tida como exclusivamente masculina, é porque no passado elas foram, em grande parte, ajudadas e auxiliadas pelas libertárias femininas, que lutando contra o machismo e o sexismo imposto pelos homens em sua época, inclusive pelos anarquistas, abriram o espaço para a aquisição dessas conquistas históricas por parte do gênero feminino na contemporaneidade.

Thiago Lemos Silva

Referências
CORRÊA, Franciso. Mulheres libertárias: um roteiro, In: PRADO, Antonio Arnoni. Libertários no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1982.

LOPREATO, Christina da Silva Roquette. O espírito da revolta: a greve geral anarquista de 1917. São Paulo: Annablume, 2000.

OLIVEIRA, Antoniette Camargo. Despontar, (Des)fazer-se, (Re)viver... a (des)continuidade das organizações anarquistas na Primeira República. Dissertação (Mestrado em História). UFU, Uberlândia. 2001

RAGO, Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

SIMMEL, Georg. A Filosofia do amor, São Paulo: Martins Fontes, 1993.



Entre o divã e a poltrona: uma análise sobre a vida e a obra de Freud sob as lentes cinematográficas.


O filme “Freud: para além da alma”, traz à tona os caminhos percorridos por Sigmund Freud no processo de construção da sua teoria psicanalítica no fim do século XIX e início do XX. Nesse sentido, a trama de John Huston, mostra que os principais conceitos freudianos foram desenvolvidos a partir das próprias experiências empíricas que este último teve para com seus pacientes.
Freud encontrou formas de pensar e compreender a realidade e a psique humana, de forma diferente e oposta do padrão convencional da sociedade vitoriana. Sociedade esta marcada por costumes e tradições, extremamente, rígidos e arraigados. Por isso mesmo, foi criticado e censurado por colegas de trabalho e outros profissionais, na medida em que tecia conceitos, tais como: o inconsciente, complexo de édipo, histeria, neurose, sexualidade infantil, sonhos, dentre outros.
Nessa perspectiva, o inconsciente se refere ao material que foi excluído, censurado e reprimido de nossa consciência. Em outras palavras, o inconsciente seria estruturado por elementos instintivos, que nunca foram conscientes e que não são acessíveis à consciência.
Já o complexo de édipo, em linhas gerais, corresponderia ao momento da infância (fase fálica) onde (inconscientemente), o menino passa a desejar sexualmente a mãe e a menina o pai. Assim, essa é uma fase importante para o desenvolvimento do superego.
A histeria é a maneira através da qual conflitos emocionais inconscientes se manifestam em forma de perturbações mentais ou em sintomas físicos, independentemente de qualquer patologia orgânica ou estrutural conhecida. Portanto, a histeria seria uma espécie de neurose causada por lembranças reprimidas e carregadas por uma forte carga emocional e que é perceptível tanto em homens como também em mulheres.
Diferentemente de todos os teóricos e pensadores da época, Freud, chamou a nossa atenção para o fato de que a sexualidade humana não se inicia na puberdade ou adolescência, conforme se imaginava. Pois, a sexualidade é um mecanismo que nos acompanha e se expressa desde o nosso nascimento. Visto dessa forma, a criança, na visão freudiana, não é um ser assexuado.
Somando-se a isso, os sonhos também tomam grande parte da obra de Sigmund Freud e, são, amplamente, discutidos no decorrer do filme. Mas, qual seria o significado dos mesmos para Freud? Para ele, os sonhos seriam uma forma da psique humana se defender e ao mesmo tempo se satisfazer. Quando sonhamos estamos colocando em voga aqueles desejos que foram reprimidos e/ou que não foram passíveis de se realizar a nível consciente.
Logo, “Freud: para além da alma”, é uma trama riquíssima que além de nos mostrar alguns dos principais conceitos da teoria freudiana, ainda nos revela a instigante forma que ele encontrou para construí-los. Isto é, tanto através de experiências que giraram em torno de sua própria vida pessoal (ao retratar a sexualidade infantil e o complexo de édipo, por exemplo), como também por meio de observações que fez dos relatos de seus pacientes. Uma vez que, como foi salientado, inicialmente ele fazia uso da hipnose como instrumento terapêutico. No entanto, vagarosamente, passa a acreditar que a melhor ferramenta para tratar seus pacientes seria encorajá-los a “falarem livremente e a relatarem o que quer que pensassem independentemente da aparente relação – ou falta de relação – com seus sintomas” ( FADIMAN ; FRAGER, 1986, P.5).

Fernanda Caroline de Melo Rdrigues



BIBLIOGRAFIA:

FADIMAN, James; FRAGER, Robert. Teorias da personalidade. São Paulo: Harbra, 1986.
FREUD, S. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Volume vii (1901-1905), Edição Padrão Brasileira, Imago, Rio de Janeiro; 1978.



Notícias libertárias


Mini-curso sobre anarquismo.

Em meio as atividades que aconteceram durante a Semana de História/X Encontro Regional de Professores de História do Triângulo Mineiro, na Universidade Federal de Uberlândia/ Campus Santa Mônica, Thiago Lemos Silva e Adonile Ancelmo Guimarães apresentaram nos dias 22, 23 e 24 de junho o mini-curso: “NÃO SE DEIXAR REPRESENTAR... VIVER A AUTONOMIA: AÇÃO DIRETA E VIOLÊNCIA REVOLUCIONÁRIA NO PENSAMENTO ANARQUISTA”. Abaixo, segue um relato dos dois.
Apresentamos esse minicurso porque compreendemos que é importante trazer para o debate político atual a possibilidade de novas estratégias de luta e resistência e, ao mesmo tempo, provocar um debate acerca da violência revolucionária e as suas diversas formas de manifestação contra os outros tipos de violência considerados legítimos: repressão policial, opressão estatal, exclusão social. Ancoramos essa discussão no conceito político de ação direta, dando ênfase nos movimentos anarquistas e sindicalistas revolucionários, manifestações importantes tanto em nível nacional quanto internacional.
Primeiramente, abordamos o processo de emergência e consolidação do anarquismo, enquanto um movimento revolucionário, que toma a sua forma histórica na ação e propaganda de Mikhail Bakunin e seus seguidores na Primeira Internacional em 1869. Nesse sentido, argumentamos que a ação econômica defendida pelos bakuninistas serviu para demarcar a especificidade assumida pela estratégia revolucionária anarquista, que surgiu em oposição à estratégia revolucionária marxista, identificada, ao menos naquele contexto, com a ação política. A despeito da terminologia evocada, acreditamos que a ação econômica reivindicada pelos anarquistas naquele contexto foi o primeiro móvel de expressão da ação direta, que, diferentemente da ação política defendida por Marx, pregava a atuação revolucionária dos trabalhadores fora dos quadros partidários.
Para o reforço de tal tese, passamos em revista, ainda que de forma sucinta, alguns tópicos concernentes ao debate travado entre Marx e Bakunin no seio da Primeira Internacional.
Num segundo momento, focalizamos o anarquismo terrorista. Explanamos que no período que sucedeu a destruição da Comuna de Paris em 1871, os anarquistas principiaram uma série de ações que objetivavam chamar a atenção do povo para a causa revolucionária. Essa propaganda levada a cabo pela ação incluía desde a explosão de prédios públicos até o roubo aos mais abastados, passando pelo assassínio de autoridades políticas. Mais uma vez, apesar da evocação terminológica, defendemos que a propaganda pela ação foi uma forma a partir da qual os anarquistas entenderam a ação direta.
A esse respeito expusemos e comentamos a recepção que a “propaganda pela ação” recebeu nos meios anarquistas. A repercussão negativa que esta modalidade da ação direta alcançou, principalmente na imprensa burguesa da época, levou os libertários a colocar em questão a (im) pertinência da utilização de métodos violentos no processo revolucionário. É possível alcançar a sociedade anárquica por meio da violência? Se sim, em quais condições ela poderia ser usada? Há a possibilidade de usar a violência, sem descambar para o terror? Dito de outra forma,é exeqüível fazer um uso ético da violência em nome dos preceitos ácratas? Tais questões que perseguiram, durante muito tempo, os anarquistas foram, ainda que minimamente, retomadas e discutidas no decorrer do mini-curso.
Posteriormente, o eixo de nossa análise se deslocou em direção ao contexto histórico em que se deu, em virtude da entrada dos anarquistas no sindicato, o surgimento do sindicalismo revolucionário na França entre o fim do século XIX e o início do século XX. Examinamos a Federação das Bolsas de Trabalho e a Confederação Geral do Trabalho, intencionando verificar o envolvimento dos anarquistas nestas duas instituições, e, a partir daí, perceber as mudanças sofridas pela ação direta enquanto uma estratégia anarquista que passou a ser vinculada, quase que exclusivamente, ao mundo do trabalho, se manifestando através das práticas de boicote, sabotagem e greve.
No entanto, mostramos que o ingresso dos anarquistas nos sindicatos trouxe muito mais problemas do que soluções. As discussões, acontecidas em uma escala de alcance internacional, atestaram o fato de que anarquistas sindicalistas e anarco-comunistas não se encontravam totalmente de acordo com as prédicas do sindicalismo (doravante chamado) revolucionário. Os anarquistas, uma vez ingressos no sindicato, deveriam permanecer eternamente nele? Eles poderiam apenas fazer propaganda ou ocupar funções diretivas? O sindicato era um meio ou um fim na consecução dos objetivos libertários? Estas são algumas, dentre várias, questões colocadas pelos anarquistas em relação ao sindicalismo que investigamos em nosso mini-curso.
Para tanto, discutimos a posição assumida por dois grandes anarquistas: Errico Malatesta e Pierre Monatte, que, cada um ao seu modo, formularam e conceberam diferentes concepções do que deveria ser a tarefa dos sindicatos. Discutimos ainda uma terceira posição: Neno Vasco que, em nossa avaliação, ocupa uma posição intermediária entre aquela assumida por Malatesta e Monatte.
E por fim, averiguamos a atualidade da ação direta. Trabalhamos com a certeza de que a experiência libertária não é coisa do passado, mas toma parte importante nas lutas cotidianas dos oprimidos contra os diversos regimes de poder a que estamos hoje submetidos.
Portanto, trabalhamos com os temas do anarquismo não apenas para informar e ensinar o que foi as diferentes facetas do anarquismo como movimento social revolucionário, mas, diferentemente, para despertar a discussão e o debate a temas que ainda hoje nos afetam como o assujeitamento passível a burocracias e hierarquias cada vez mais insidiosas e desprovidas de sentido e a desilusão intensa com os políticos, nossos ditos representantes que se tornaram uma casta que nos envergonha, causa descrença, mas é incapaz de nos incitar a revolta, pelo menos numa escala mais ampla e conseqüente.
Gostaríamos de agradecer a todos que participaram do mini-curso, em especial ao Daniel, Adair, Adilson, Sandra, Eric, Mateus, Ana Luiza, Flávia e ao Leonardo pelo interesse que demonstram no anarquismo e nas alternativas que ele pode trazer para o contexto político atual.






Centro de Cultura Social de São Paulo realiza Seminário para comemorar  o bicentenário do nascimento de Prouhon

Proudhon entre nós

É espantoso que se conheça do pensamento proudhoniano pouco além do slogan “a propriedade é o roubo!” Não obstante ter recebido de Marx o enfático elogio que o celebrou “como o pensador francês mais arrojado” e conferiu à sua obra O que é a Propriedade? a mesma importância atribuída à obra de Sièyès, O que é o Terceiro Estado?, Proudhon permaneceu historicamente um célebre desconhecido.
Até a 1ª Internacional e a Comuna de Paris, Proudhon exerce forte influência sobre os operários, artesãos e communards; mas em seguida é vencido pelo bakuninismo. Bakunin legou para a posteridade a leitura hegeliana que classificou Proudhon de “pré-anarquista” e que qualificou seu pensamento de metafísico e desprovido da cientificidade exigida pela revolução. Face ao revolucionarismo bakuninista, Proudhon é retratado como a criança rebelde do socialismo.
Foi com o declínio do hegelianismo e com a ressurgência de Nietzsche, a partir dos anos 1990, que um forte interesse renovado pela obra de Proudhon se fez presente, nutrido sobretudo pelas filosofias de Foucault e Deleuze. Esta retomada de Proudhon reflete uma renovação sem precedentes do próprio anarquismo, restituindo a força da sua crítica na atualidade e estabelecendo novos percursos de estudos. É neste contexto de redescoberta e renovação da obra de um dos autores seminais da anarquia que o CCS propõe neste seminário pensar sua atualidade no ano de seu bicentenário; dando continuidade, com isso, ao ciclo de estudos iniciados em 2008 com as Oficinas Libertárias: Proudhon.
Coordenação:Nildo Avelino

Programa:
12/09/2009, abertura:
Proudhon nas dobras do milênio, com Paulo-Edgar Almeida Resende (Doutor em Ciência Política, professor na Faculdade e no Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP onde é coordenador do Núcleo de Análise de Conjuntura Internacional (NACI), co-organizador, juntamente com Edson Passetti, do volume Proudhon – Coleção Grandes Cientistas Sociais [São Paulo: editora Ática, 1994]).

19/09/2009:
A miséria ou o antifilosófico em Proudhon, com Edson Lopes (Mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP, autor de Política e Segurança Pública: uma vontade de sujeição [Rio de Janeiro: editora Revan, no prelo], integrante do CCS).

26/09/2009:
Anarquia, num encontro com Proudhon e Deleuze, com Natalia Montebello (Doutoranda em Ciência Política pela PUC-SP, professora na ESPM, integrante do CCS).

17/10/2009:
Proudhon, Foucault e a (an)arqueologia dos saberes, com Nildo Avelino (Doutor em Ciência Política pela PUC-SP, autor de Anarquistas: ética e antologia de existências [Rio de Janeiro: Achiamé editor, 2004], integrante do CCS).

24/10/2009, encerramento:
Proudhon e a (pós)modernidade: reflexões im-pertinentes, com Jacy Seixas (Doutora em História, professora e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em História da UFU-MG, autora de Mémoire et oubli: l'Anarchisme et le Syndicalisme Révolutionnaire au Brésil [Paris: éditions de la Maison des Sciences de l'Homme, 1992], integrante do CCS).

Fonte: http://www.ccssp.org/



Editora Faísca lança biblioteca virtual

É com muito prazer que gostaríamos de anunciar a todos vocês o lançamentoda Biblioteca Virtual da Editora Faísca! Nesse novo espaço dentro de nossapágina, disponibilizaremos para download gratuito diversos textos.Fruto do trabalho da lista de voluntários da Faísca, nossa BibliotecaVirtual já está no ar dispondo dos seguintes livros: "Feminismo, Classe eAnarquismo", de Deirdre Hogan -- Revolutionary Anarcha-Feminist Group(RAG), "Domingos Passos: o 'Bakunin brasileiro'", de Alexandre Samis eRenato Ramos, "Huerta Grande -- A Importância da Teoria" e "O que éIdeologia?", ambos da Federação Anarquista Uruguaia (FAU), "Anarquismo eAnarquia", de Errico Malatesta e "O que é Anarquismo?", de Nicolas Walter. Mas estes são apenas os primeiros títulos! Pretendemos alimentar essainiciativa constantemente e já temos algumas dezenas de outros textos para serem lançados. Aproveitamos a oportunidade para agradecer publicamente aos dois maioresresponsáveis pelo lançamento da nossa Biblioteca Virtual. Ao Farrer e ao Luiz Carioca, o nosso muito obrigado pelo excelente trabalho! Esperamos que essa iniciativa se amplie, continue dando frutos, e claro,que todos visitem, aproveitem e divulguem esse trabalho!

Fonte: http://www.alquimidia.org/faisca/index.php

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